domingo, 7 de dezembro de 2008

... pela janela do quarto

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Heaven

Depois de pedir demissão a Doctor Chiquira, meu ex-chefe, uma espécie de árabe ótima-praça casado com uma médica que tem uma clínica no centro de Londres, aqui estou - Heaven. Da Harley Walk-in Clinic, dito do panfleto que eu carregava, não mais. Chiquira era o responsável pelo direcionamento dos agentes do desemprego, ou - do subemprego e lamentou minha saída me dando mais dinheiro do que deveria.

Minha nova jornada: cloakroom staff, que nada mais é do que a pessoa que guarda suas roupas e bolsas enquanto você desenvolve seu grau de desenvoltura e entorpecência. A melhor parte é que o serviço é prestado em uma boate gay que tem pelo menos 30 anos de estrada - gays orinundos das mais vastas bocetas do universo.

(Me pergunto como ter infortúnios relativos ao humor em Londres caso você tenha dinheiro em larga escala. Dinheiro para dar, no caso, e comprar. Doctor Chiquira me paga quase o dobro por uma semana de trabalho por pura simpatia). Importante também rememorar que você TEM QUE pegar o panfleto, principalmente quando a temperatura não ultrapassa os 5 graus.

Visions
Milionários de Dubai, homens musculosos, vozes estridentes, homofóbicos bêbados, patricinhas cheirosas, seguranças negros, risadas incontidas, uma menina que chora sozinha pergunto o que está acontecendo e ela faz cada vez mais bico (?), acho que estou-co-entrando-piedosa-em-tua-viagem-de-ácido, bilhetes perdidos, mil brasileiros no salão, casacos nunca-lavados, pré-potentes, bolsas pesadas, YMCA, gorjeta.

domingo, 30 de novembro de 2008

Squatt party

Fazem aproximadamente 3 ou 2 graus lá fora. Aqui dentro tudo parece mais frio - talvez as sensações estejam se confundindo. Velha-guarda da portela, diz Rafaela. Talvez da Mangueira também, respondo ao observar. Vários grupos semi-seculares envolvem o ambiente, dando-lhe uma bizarra graça holística. A festa começa, e o local (o que será invadido) só saberíamos a poucas horas do início.

Estamos em um antigo boliche abandonado, ao sul - em Streatham Hill, perto de Brixton. Dois andares de situações realmente bizarras. Müsica ambiente: trance e progressive. Talvez eu durma um pouco depois de um longo dia de mudanças. Do norte para o oeste, onde me instalo com meus aproximadamente 50 quilos de pertences.

Aqui, da squatt party, vejo o desencadeamento da loucura programada em escala. Gases semi-alucinógenos. Gotas ácidas respingam pelas paredes enquanto dezenas de jovens sugam balões inflados com gases obscenos - talvez nitrogênio. E foi aí que eu senti o obsceno, merci Artaud. Tudo obviamente natural para a circunstância. Talvez um cop a paisana, conclui Rafaela. O-paisana passa com sua incrível "jaca" negro-amarelo-policial, tapinha nas costas, como se comemorasse conosco a sobriedade, ou a ausência da mesma.

Daqui, de onde eu durmo


Eu não quero sair do meu corpo. Este é meu corpo e preciso dele mais que nunca e agora: pista de dança. Batidas progressivas entortam minhas pernas. Eu vou dormir, eu vou... É muito cedo para eu me cogumelizar. Velha-guarda da portela, rememoro. É cedo. Muito cedo. No es., no m.ds.

Eu sou uma bola enroscada em minhas pernas dormindo em um boliche abandonado. Sensação térmica abaixo de zero. Mas valeu a experience, não tanto pela musicalidade, e sim porque em definitivo - eu estou para o trance assim como Dalí está para a escola realista ou eu estou para o cogumelo assim como um homem está para uma drag; realmente perto se quiser mas no total oposto genital. Não mental. Talvez. Preciso pensar mais sobre o paralelo.

Saímos do local e a manhã já estavava nevada. Primeira visualização do fenômeno. Gotículas, desta vez de neve, respingam em nossos gélidos compartimentos e agora o frio foi embora ciau, ciau, e tudo parece começar outra vez num ponto de ônibus - metrô- casa - cobertor.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

David Bowie?


.... as vitrines te vendo passar

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

work wanted: leaflet

Leaflet nada mais é do que o famoso entregador de panfletos. Aquele sujeito que oferece papéis com propagandas de terceiros. E você possivelmente nega. "Não, obrigado". Ou apenas uma fechada de olhos, negando com afeto, ou nojo, ou até mesmo auto-constrangendo-se "eu finjo que disfarço e você finge que não tá me vendo". Pois é. Você pode tentar dar uma de presevacionista e dizer que não pega os tais papéis porque é contra o desmatamento ou sei-lá-o-quê você é contra. Mas isso não cola. Não faz sentido. Em alguns casos sua negação pode se refletir em fome, insuportável dor de cabeça, desespero e na pior das hipóteses: despejo. E você se pergunta COMO (enquanto o de lá não COME)? Em alguns casos, as pessoas pegam esses empregos de última hora para pagarem sua próxima refeição ou mesmo o aluguel, o que fica um pouco difícil - muitas horas a mais, muito sacrifício. O meu caso não é desesperador, mas os de algumas pessoas que trabalharam comigo - possivelmente sim.

O certo é que, quando alguém te oferece um panfleto você tem que pegar. Porque o cara que está ali realmente está fazendo isso porque precisa. E você pode ajudá-lo. E você pode pegar o panfleto e jogar no lixo mais próximo, e fazer isso somente para que desesperados continuem tendo trabalho de última hora.


Considerações antropológicas após uma semana em campo. *Panfletando em uma das saídas da estação Oxford Circus (uma das avenidas comerciais mais populares de Londres)
- 100% dos humanóides passantes, do tipo indiano (pele negra, cabelo preto liso, olheiras, olho grande e nariz estranho), costumam tratar agentes do sub-emprego como lixo, ou doença. Fazem cara de nojo, desviam a cara, o passo, e seguem em seus ordinários rumos;
- 100% dos pequenos e mais cabeçudos humanóides, do tipo orientais, geralmente muito bem vestidos e penteados, fazem questão de desperceber o agente do sub-emprego e olhar diretamente para a vitrina mais próxima;
- 95% das mulheres negras fazem questão de compactuar com agentes do sub-emprego. Por que será? (Lerê-lerê);
- 80% dos que fazem o tipo inglês-tradicional, mesmo na maioria das vezes não aceitando o papel que por você é oferecido, fazem questão de olhar pra você e dizer "No, thanks", ou simplesmente "Sorry" e sorriso;
- Patricinhas não enxergam os agentes, e quando por acaso topam com eles, respiram enojadas;
- Jovens, estudantes, garis e pedreiros do tipo "já passei ou estou passando por isso" compactuam com destreza e naturalidade, afinal, no mesmo barco sacaneado estão.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

you can leave...

Enquanto você bebe e conversa alguém pode estar de olho na posição de sua carteira, dentro de sua bolsa, sua conversa, seu rumo, seu signo e ascendente, seu futuro, embaixo de suas pernas, no chão - mesmo sem ninguém por perto. E quando você menos espera (pimba!): um emprego ou alguém, uma cerveja ou um café, a mão esquerda da luva ou uma resposta, um rumo, um quarto, um bebê bochechudo, uma moeda, tudo - tudo acontece como deveria ser.


Bêbados habilidosos também perdem documentos. Não a destreza nem a capacidade de dar o foda-se. Afinal, como diria reinaldo-janequine (ou seria roberto-jefferson?):nada é tão importante.

sábado, 15 de novembro de 2008

I'm so sorry

... curvas, tubes, esquinas, catacras, portas, banheiros. Sorry é definitivamente a palavra mais pronunciada no decorrer do enquanto - Eu vou é mesmo com minhas pernas!
(um motivo óbvio pra dizer o contrário)
1 - Quando você quase é atropelado por um táxi branco que surge do nada, como o bizarro casal de velhinhos em Mulholland Drive (cidade dos sonhos).

Talvez um atropelamento não seja uma explicação óbvia para uma das mortes possíveis, nem mesmo a existência e a necessidade de termos veículos motorizados - ou tantos deles.

... vou desligar o interruptor. It was a good lay.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

looking for a job

na chuva - de pub em pub - de bar em bar - rodando em círculos no centro - estações centrais. custo de vida - moradia - looking for a room - looking for a job again. eu poderia até trabalhar no clockroom de uma boate gay caso eu tivesse um insurance number no qual são recolhidas as taxas da rainha. anoitece muito cedo e isso é estranho porque ao mesmo tempo que está cedo está tarde e quando você menos espera está, por volta das cinco da tarde, na fila do Blues Pub depois no Oneills - tomando cyder - ambos pubs muito aconchegantes do centro - o primeiro, como diz o nome, blues ao vivo, o segundo um pub irlandês que tem, pelo menos, três filiais. e você já não pensa mais em casa ou emprego ou futuro ou passado - somente tenta encaixar os círculos que se abrem. "you can sit here", Constantine (da Romênia) - Vincent (França). "which language they are speaking?". Rafaela e Tamara falam português, falam muito sobre tudo acima mencionado entre outras coisas que são ditas rápido, no tempo desse lugar. duas semanas e eu nem vi. mas o fato é que algumas palavras em português são exatamente as mesmas em romeno. vaca, por exemplo. algumas músicas podemos ouvir sempre - anywhere - Serge Gainsbourg- Vive la Fete - Roxette. I dont remember the number of my mobile. são onze números seguidos e talvez eu nunca decore. im looking for a job e um quarto bem longe muito distante da casa de indianos fanáticos por limpeza. essa é a pior parte. um capítulo a parte.


Estação Piccadilly Circus (minha escola; a esq.)

sábado, 8 de novembro de 2008

Chazinho das 21h

Um chá inglês depois de pegar a circle line pela primeira vez - perto de Nothing Hill que de facto ainda não conheci. Lá estive com um amigo do Clei (hasta Floripa) e também um sociólogo inglês figura. Várias histórias. Londres séculos atrás. Numa delas, Jack the killer, not the ripper, talvez entre o século 18 e 19, com sua super-mini-faca mata adversários num jogo de espadas. Até no escuro. Sem piedade. Também uma música encantada que se perdeu. Talvez eu deva ter entendido 80% do que Conrad dizia, principalmente com os olhos e as mãos. Principalmente reflexos-profundos de considerações superficias sobre o que foi mencionado: o encanto que se perdeu, as buscas, Paulo Coelho e a viagem ao centro da terra, buddah, o segredo... Algumas coisas vão se encaixando: papéis arquivados em gavetas passadas. Eu penso que preciso arrumar um trabalho logo, e, na pior das hipóteses, eu me torne uma flash-iogue de calça jeans do futuro. Muitas coisas circulando pela cabeça. A mudança ou o ciclo do tempo: de dia sol, de tarde chuva, de noite vento. Cada vez mais vento. Eu estou quase alçando vôo.

Raro: sol no caminho - saindo de casa

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Yes we can!


Aeroporto de Heathrow. Aqui estou. Barack Obama é eleito presidente dos EUA. Choke entra em cartaz a partir do dia 20 de novembro - uma das histórias mais geniais que já li. É um dia fácil de ser lembrado. De qualquer forma aqui estou para buscar o Bruno, figurinha da faculdade que veio morar/estudar por aqui também. Ele chega por volta das 13h, fumamos, pegamos o trem de volta e vamos em busca de sua escola para pegar a chave da casa onde ele deve morar no primeiro mês. Duas malas.

Descemos em Finsbury Park e saímos em busca da escola. Há muitos muçulmanos pelo caminho. Mesquitas. Código de vestimenta islâmico. Chegamos à escola. As instalações são meio precárias. Preciso ir ao banheiro. Há uma brasileira por perto... Depois de pegar a chave voltamos à estação de Finsbury e agora vamos para Walthamstow Central, a última parada da linha Victoria. Procuramos pela casa e logo um rapaz nos ajuda a achar. Ele nos leva até a porta do local.

Meio acanhado e mais perdido que "bunda de frango", como ele mesmo diz, Bruno aperta a campanhia da casa. Ninguém abre. Entramos com sua chave. Depois saímos em busca do quarto que ele vai ficar. A casa, muito parecida com todas que tem por aqui, é bem quentinha e perto do metrô de Walthamstow - ao meu ver a coisa mais importante, senão a mais - a proximidade do tube. Um húngaro está dentro da casa. Ele prefere não falar muito e nos aponta o quarto. Entramos, enfim.

Menos de cinco minutos após abrirmos a porta do quarto e somos surpreendidos por dois mexicanos que ocupavam o quarto antes. Albergue espanhol? Conversamos um pouco, principalmente sobre Chapolin e Chaves, Roberto Bolaños e Silvio Santos. Temos também um brasileiro e uma colombiana na casa... O Bruno tem - eu mesma ainda estou na casa dos indianos já em busca de um lugar para morar. Talvez eu consiga algo aqui por perto para morar no próximo mês... Um emprego e um quarto para morar são as coisas que mais me preocupam, mesmo enquanto ouço os sons da cidade.


I was waiting...

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Sul de Londres

A vida aqui está cheia de surpresas e constatemente me deparo com novos universos, visões e possibilidades. Uma das coisas que mais me comove, ou impressiona, são as crianças – ou seu modus operandi em Londres. Na verdade, a comoção parte, talvez, de como as mães transportam seus filhotes. Elas geralmente estão em carrinhos de bebê e não choram nem se movimentam. Penso que talvez seja o frio. Há sempre um espaço especial no ônibus, e também no metrô para estacionamento de carrinhos. Hoje, voltando pra casa, a mãe lia um livro, já nas últimas páginas, em voz alta para o filho - o outro dormia no carrinho. Eu penso que não via tanta gente lendo ao mesmo tempo há muito tempo.


SOUTH LONDON
Neste sábado (01/09) estive em três pubs diferentes. Foi um dia de desbravar novos tubos. Por volta das 15h saí de casa. Chovia um pouco. Sem medo, peguei o metrô em Hendal Central, estação mais próxima de onde estou (like an indian), e desci em Golders Green. Andei pelas ruas pra passar o tempo: entrei uma livraria, uma loja de roupas promocionais (sempre é bom ter um casaco a mais), um vestido, depois tomei um café na Starbucks - uma em cada esquina. Aqui se toma muito café. E também se come muita batata. De Golders, segui para London Brigde onde peguei outro, uma espécie de "little tube" para New Cross Gate. Em New Cross peguei um ônibus e desci na rua do Ivy House: comi e conheci Antonio, um turco que gosta de "futebolo e carnavalo".

Quando entrei no Ivy House estava vazio. Um pub de velhos bêbados. Mas e mais senhores chegando e foi aí que conheci o A., um inglês que deve beirar o sessenta anos. Ele fez questão de me apresentar mais dois pubs. Guardamos nossa cerveja. Fui apresentada aos donos do Montague como "minha amiga jornalista brasileira". Esses velhinhos embaixo são os donos do pub, que deve existir, desde, aproximadamente, 1930. Ainda estou penando um pouco com a língua. Somos bêbados habilidosos. Ainda fui em mais um pub, mas não tirei foto. Um pub trash, uma cantora com voz fina e estridente em performance. Depois um tecladista de poucas notas. Mais pints. Mais... Voltamos ao Ivy e tudo parece um pouco mais resolvido: a noite, o baile de máscaras, a banda, os senhores e as senhoras. Tudo está mais calmo e já é hora de voltar para casa, ou passar por um lugar quente e aconchegante antes de qualquer outra coisa que não seja dormir.


The Ivy House
40 Stuart Road, Peckham





Montague Arns
289 Queens Road

sábado, 1 de novembro de 2008

As an indian

O fato é que eu paguei por uma hospedagem no período de um mês e acabei chegando aqui, na casa da srta Emma, seu marido Kamal e sua filha Duvina - uma família indiana. O local está mesmo “cheirando a curry” como diz a Rafa, mas é tudo muito limpinho, novo e organizado. A casa fica em um bairro possivelmente onde residem muitos indianos – eu vejo pela janela do ônibus. Meu quarto é pequeno também, mas é muito aconchegante. O banheiro tem uma banheira (como de costume aqui) e também está sempre limpo e organizado. O único problema até agora pra mim foi a porta de entrada – ou melhor, as duas portas que insisto em não saber trancar. Eu chego tarde, depois de ir a um pub em Camden Town, bairro costumeiro de Amy Winehouse. Muitos pubs, muita gente esquisita andando pela rua, estúdios de tatuagem e roupas descoladas. É tudo meio familiar e ao mesmo tempo totalmente desconhecido. Talvez em alguma vida passada, talvez somente empatia. Tomo algumas cervejas, acabamos sentando e colocando a conversa em dia. Rafaela, Ana Maria e Tamara conversam em português e Jean não entende nada. No fim da noite aqui o pessoal como Kebab, fish and chips, chiken ribs, pizza e um hot-dog de linguiça. Sempre tem ônibus ou metrô pra todo e qualquer lado. O transporte em Londres (um capítulo a parte, é preciso). Eu deveria não perder o jornalismo que há em mim.

Continuo escrevendo...

Viva Pelé do pé preto

Uma das coisas que um estrangeiro, principalmente sul-americano, brasileiro, pobre e com cabelo de preto, teme, ao chegar em um pais europeu, é a passagem pela alfândega. Então, nós, pretos meio pelés e sem nenhum comando a não ser o dos próprios pés, nos vemos em uma situação das mais passíveis da histórica escrotagem nórdiga. No caso eu, Tamara, 24 anos, seis meses estudando em Londres ao invés de três porque gostaria de não pensar em cálculos neste momento (isso me foi questionado na alfândega), deveria ou não temer um retorno imediato - deportation of imigration? Depois de responder que eu apenas gostaria de estudar, além de viver uma vida menos ordinária, tive que passar por um raio-x de pulmão. Poderia meu pulmão ser colombiano, continuo me perguntando até que ponto não, até que ponto aparentemente não, também. Eu sou a Colômbia do nariz empinado e não vou baixar a cabeça, só as calças porque meu inglês ainda não funciona bem e eu nem sei para onde estão me levando. E antes Colômbia que Estados Unidos. E antes aqui que no mesmo lugar. Raio-x do tórax, nenhuma evidência. A passagem está livre. E eu, acho que a cada dia mais...

Gliding in the sky

Aqui chego depois de 12h de vôo ao lado de um senhor, eu diria, um homem bonito com um pouco mais de 40. Depois de sentar ao meu lado, sorri e faz as mesmas coisas que eu faço. Sex and the city (o filme), massa, suco de laranja, um pouco mais de água e fones de ouvido. As vezes, durante a noite, nos encostamos os cotovelos ou as coxas – eu durmo de perna aberta, ou melhor, sento, e continuo sendo uma lady, garanto, sou uma lady. Durante a noite uma criança chora, e grita e chora. Eu acordo várias vezes e minhas pernas estão anestesiadas. Pela manhã ele pede primeiro omelete e eu calzone, enfim nós dois em “blocos nítidos e separados”, merci Hilda. Uma coisa que me irrita profundamente é o plágio, ou situação que se assemelhe, mas o fato é que não consigo me irritar neste momento ou mesmo pensar em algo como plenitude ou acasalamento. Estou suspensa. That`s my interzone? Não conversamos. Apenas pedi para que ele pegasse minha mochila – e o fez sorrindo. Gosto da direção dos pêlos do teu braço. Na minha frente um bebê coreano que ri muito – vejo seus dois dentinhos brilhando perto dos olhinhos que os meus também dizem, sim sim Murilo, eu estou aqui, eu sou o sorriso da senhora Tamara E. Costa.

Interzone


Depois de dois meses vagando pela interzone, um local que fui parar devido a peripércia de não mais aceitar socar aquele tijolo diário da mesma forma, aqui chego. Aeroporto de Guarulhos, São Paulo. As pessoas se atropelam com suas malas. As pessoas não se olham, e quando alguém te olha você começa a se perguntar se algo está errado ou mesmo a falta que alguém que olha pode ter do que fazer. Eu olho para um japonês que está na minha frente. Não sei se ele está dormindo. Estou numa ala de pessoas de olhinhos puxados, próxima a saída de Emergência. São 22h03, acabo de tomar um café duplo e tento uma conexão com a internet, mas ela precisa ser paga. São 12h de vôo até Londres, espero que minha bunda magra não murche ainda mais depois disso. Não estou ansiosa. Na verdade o que eu sinto é desapego - acho que era mesmo essa a intenção – largar todos os tijolos ou mesmo quebrá-los - um por um - na tentativa de mudar o rumo previsível das coisas. Um rumo escrito à mão, e com minhas próprias. Tem outro japa do meu lado sentado dormindo também. Je ne se pás. Uma vez me disseram que nunca se volta de uma viagem, e era isso que eu queria dizer, mesmo a viagem não sendo de LSD. Não quero falar sobre despedidas.

Mom, you`re so fucking special for me
That`s all.

Tamara
(24/08/08)